Inteligência Artificial e os Desafios da Cana-de-Açúcar em São Paulo
Pesquisadores brasileiros buscam desenvolver Inteligência Artificial que mapeia solo em larga escala e indica a agricultura economicamente viável
A insegurança alimentar é um problema global que afeta milhões de pessoas, com ênfase nos mais pobres, os quais não conseguem acessar alimentos suficientes para manter uma dieta equilibrada. Além disso, o crescimento populacional, a urbanização e o aumento do consumo por parte das classes mais altas amplificam a demanda alimentar.
O crescimento da população mundial coloca pressão considerável sobre a produção agrícola global. Por exemplo, São Paulo, o maior estado brasileiro produtor de alimentos, desempenha um papel fundamental nesse contexto. Contudo, a produção local enfrenta desafios, incluindo a limitação das terras agricultáveis e a necessidade de aumentar a produtividade sem comprometer o meio ambiente.
No caso específico de São Paulo, as novas regulamentações sobre emissões automotivas (Euro 7, Tier Programs-EUA, China VI, PNLT-Japan e Proconve-Brasil) [R1] introduzem um desafio adicional. A redução do uso de motores a combustão pode impactar diretamente a demanda por etanol, um biocombustível amplamente produzido a partir da cana-de-açúcar. Historicamente, o etanol desempenhou um papel relevante na matriz energética brasileira, com o Proálcool impulsionando a produção de cana para biocombustíveis (Morais, Oliveira e Diaz-Chaves, 2015).
Outra questão que chama atenção para o preço do açúcar está na mudança dos hábitos alimentares da população mundial. Segundo o The Food Institute (2024), a crescente demanda pela semaglutina tem alterado o comportamento alimentar de adultos, que em regra era inelástico. Esse novo hábito alimentar modifica a estratégia de grandes empresas de produtos alimentícios, substituindo o açúcar, derivado da cana, por outras fontes com menor impacto no índice glicêmico.
Ao observar o universo dos produtores de cana, tanto o mercado automotivo, quanto o mercado açucareiro, podem preferir manter o nível de produção no curto prazo, devido os preços do açúcar nos mercados mundial e nacional. Contudo, com o aumento dos veículos elétricos e a substituição de insumos no processo de produção de alimentos, a indústria do etanol, e consequentemente da cana-de-açúcar, enfrentam o risco de declínio.
O estudo, ainda em desenvolvimento, e apresentado sem revisão por pares, dos doutores Shinkoda M. e Da Costa Silva, M. (2023), utiliza inteligência artificial para analisar as áreas dedicadas à produção de cana em São Paulo, propondo possíveis alternativas agrícolas para essa cultura.
Os autores mapearam as áreas plantadas com cana-de-açúcar, dividindo o estado de São Paulo em regiões próximas aos centros de distribuição (Ceasas). Essa divisão foi necessária para facilitar a avaliação e viabilidade econômica dos produtos a serem sugeridos pela inteligência artificial.
A técnica empregada para o treinamento da IA levou em consideração a escolha dos produtores de todo o Brasil, diante das características enfrentadas por eles, como as relações climáticas e o tipo de solo. Após esse treinamento, a inteligência artificial alocou em São Paulo os produtos mais adequados de acordo com as características das regiões com cultura de cana-de-açúcar.
A análise sugere que a substituição da cana-de-açúcar por outras culturas pode ser uma saída viável, tanto para garantir a segurança alimentar quanto para adaptar a economia agrícola às novas realidades do mercado. De modo geral, os autores identificaram que culturas como tomate, abacate, banana, goiaba, e tangerina poderiam ocupar áreas que atualmente são dedicadas à cana e alinhadas com as condições climáticas e ambientais dos locais em que, atualmente, há produção de cana-de-açúcar no estado. “Além de diversificar a produção, essas culturas podem ser mais resilientes diante das mudanças climáticas e da demanda global por alimentos ” (p. 4-5, tradução nossa), concluem os autores.
Os autores ressaltam que a IA desenvolvida não busca substituir o conhecimento técnico e científico e que sua implementação deve ser observada com cautela. Segundo eles, “[...] o modelo implementado utiliza apenas aquilo que já foi utilizado pelos produtores brasileiros para treinar a inteligência artificial. O máximo que o modelo pode chegar é na fronteira do conhecimento. A utilidade do modelo é na disseminação dos produtos agricultáveis e viáveis em cada local. Porém, a sua efetiva implementação ainda carece da inteligência humana na busca do maior bem-estar sustentável.” (p. 4-5, tradução nossa).
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REFERÊNCIAS
Morais, L. D., Oliveira, L. M. B., & Diaz-Chaves, R. (2015). Socio-economic impacts of Brazilian sugarcane industry. Environmental Development. V. 16. P 31-43.
Shinkoda, M., Da Costa Silva M. (2023). Structural adjustment of são paulo sugarcane plantation in the automotive emissions standard context. Disponível em SSRN: https://ssrn.com/abstract=3899216 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3899216
Vince, Martin (2023). Analysis: Ozempic Likely to Impact Snack Manufacturers’ Bottom Line. The Food Institute. Disponível em: https://foodinstitute.com/focus/analysis-ozempic-likely-to-impact-snack-manufacturers-bottom-line. Acessado em: 24/10/2024.